A liberdade de contar histórias pela metade

Capa do livro Fim de tarde, início da noite



Eu não tenho uma história de origem como escritor muito empolgante para contar. Acho que já fiz isso em algum texto aqui, mas credo reler as besteiras que eu falo.
Em resumo, é aquele padrão: Senhor dos Anéis, fantasia medieval, um dia vou escrever a nova série de milhares de páginas que as pessoas vão fazer cosplay em algumacoisacon.
Ainda bem que a gente muda, né? Felizmente, o Guilherme "Próximo Tolkien Vocês Vão Ver" Pimenta ficou para trás.

Ninguém precisa produzir exatamente o que consome

Embora eu ainda goste muito de fantasia medieval e até tenha um livro que usa essa ambientação na história, o apelo que eu tiro do gênero é bem diferente hoje em dia. Veja bem, eu gostaria muito de quem sabe fazer uma história mais alta fantasia, de deuses e entidades e criações de mundo. Mas essa é uma ideia cada vez mais no fundo da mente.
O que a gente faz ao longo do tempo é nos descobrir. No meu caso, foi descobrir que o que eu gosto de consumir nem sempre é o que eu gosto de produzir. Minhas tentativas de grandes sagas geralmente acabam no meio porque os acontecimentos necessários se tornam uma areia movediça.
Eu já falei aqui também sobre como eu gosto de escrever diálogos. E talvez uma estrutura mais George R. R. Martin funcione para mim, de usar diálogos como forma de passar por acontecimentos. Mas eu não tenho nem um décimo dessa habilidade, então...
Ok, eu estou discutindo comigo mesmo enquanto escrevo.

Histórias pela metade também são histórias inteiras

A questão principal aqui (que vamos ser sinceros, é só uma desculpa para promover um livro novo) é que grandes histórias, na minha cabeça, eram grandes em volume e faziam arcos. Precisavam de um ponto de partida e uma linha de chegada. Origem, confronto, fechamento.
Essa chave só virou em mim recentemente, quando escrevi Sempre a Oeste!. Pela limitação de palavras em um edital, percebi que teria que abandonar elementos de suporte para me focar apenas no momento em que se passa a história, sem ligar para o mundo em volta dela.
E não é cada momento um mundo em si? Uma foto é uma história, por mais que você não conheça quem está nela. E quanto mais você olha para ela, mais detalhes encontra. Arcos próprios que sua cabeça monta pela gestalt.
Foi fazendo essa história que percebi que já havia feito o mesmo em todas as outras. Em O Espectro de Iks, a narrativa tem começo, meio e fim, bem tradicional. Mas toda a história maior por trás ficou de fora. Porque, embora ela ajude a enriquecer aquele mundo, não é fundamental para o mundo daquelas pessoas naquele momento.
É essa mudança (um coach diria insight) que mais contribui hoje para eu encontrar meu próprio estilo. É o que me trouxe a mais uma história pela metade.

Não há nada de relevante no começo da tarde, nem no resto da noite

Fim de tarde, início da noite é mais uma experiência minha nesse sentido. É a primeira vez que tento fazer uma história realmente do tipo slice of life, ou fatia de vida. Uma situação cotidiana recortada para mostrar um momento específico de um dia da vida dessas pessoas.
Em um primeiro contato com a história, você pode dizer: "Mas, Guilherme, isso é só uma tentativa ruim de fazer sua própria Trilogia do Antes".
E eu responderia: "Mas é exatamente isso".
Porém, em um segundo momento, eu poderia argumentar que a ideia surgiu na verdade ao pensar em uma própria memória minha.
Existe apenas um elemento neste livro que é biográfico, mas não vou contar qual. Foi uma memória que emergiu daquele jeito aleatório que elas sempre fazem e fiquei tentando relembrar o resto do que aconteceu em um dia parecido com o que é contado.
Memórias também são pedaços incompletos de histórias. Seu cérebro uma hora abandona o que vem antes e depois e o contexto do acontecimento nem sempre é preciso.
Porém, mesmo assim, temos um sentimento que fica sobre a situação. Esse sentimento é a história. Uma vergonha, uma descoberta, uma felicidade, uma tristeza.
Contar uma história como fatia de vida é como descrever a foto. O que está fora do quadro ajuda a dar contexto, mas não é o principal. É focar nos elementos que estão presentes naquele momento e expandi-los até que virem seu próprio universo.
Isso não é tão interessante quanto grandes sagas cheias de acontecimento? Não é um acontecimento só tão rico como a soma de vários? Hoje, tendo a pensar que sim.
É isso que eu exploro em Fdt,idn. Talvez agora você esteja com uma expectativa maior do que deveria para uma história curta e sem muito propósito. Mas essa é a ideia de fazer Marketing, não é? Aqui vai meu CTA:




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